Porto Alegre, 24 de março de 2020.
Estão sendo dificílimos os dias atuais que atravessamos em face da pandemia MUNDIAL do COVID 19. Impensável há poucas semanas que um evento poderia, de forma tão rápida e avassaladora, paralisar todo o mundo (literalmente), colocando dentro de suas casas todas as pessoas, independentemente da classe social.
MAS ESSA É A NUNCA VIVIDA ANTES REALIDADE!
Inquestionável que vamos ultrapassar essa etapa, mas ela deixará ENORME CUSTO, desde os mais pesados (vidas que foram ou serão ceifadas) até implicações que afetarão diretamente os negócios e, via de consequência, o mundo jurídico. Esse, modesta e objetivamente, o foco desse arrazoado.
Não há quem escape ileso dessa crise, em maior ou menor proporção. No mundo dos negócios, muito se tem falado no turismo (empresas aéreas/terrestres e hotéis), mas a verdade é que todos serão afetados. E, obviamente, o ajuste dessa situação vai levar algum tempo e vai demandar das partes envolvidas uma enorme condição de BOA-FÉ, BOM SENSO E TRANQUILIDADE. Impossível imaginar que as pessoas envolvidas num contrato possam pretender simplesmente a aplicação da antiga ideia do pacta sund servanda (“os pactos assumidos devem ser respeitados”). Em qualquer situação e considerando o que está acontecendo, essa regra não deve ser aplicada nem o sujeito deve imaginar buscar sua aplicação no Poder Judiciário. Aliás, Poder Judiciário que deverá apreciar quantidade enorme de situações oriundas dessa pandemia, aumentando dramaticamente a quantidade de processos judiciais, que já é gigantesca.
Resultado de toda essa realidade exposta é que quase todas as pessoas que antes dessa pandemia estavam envolvidas em uma relação contratual terão, de alguma forma, de ajustar alguma coisa nesse negócio. Inquestionável que as condições conhecidas e consideradas quando do fechamento do negócio sofreram alguma alteração ou interferência, direta ou indiretamente, de maior ou menor intensidade. Mas é inquestionável que houve alteração e isso gera impactos e reflexos no negócio celebrado.
Muito provavelmente não se erre afirmando que jamais se viveu, antes dessa epidemia (nem mesmo em tempos de guerra), um momento em que aplicável para quase todas as relações humanas a TEORIA DA IMPREVISÃO, através da qual EVENTOS IMPREVISÍVEIS E EXTRAORDINÁRIOS abrem a possibilidade de desfazimento ou revisão forçada do contrato, até para evitar que as obrigações de uma das partes se torne exageradamente onerosa.
Nosso Código Civil de 2002, ao tratar dos contratos em geral, estabelece em seu Artigo 422 que: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como na sua execução, os princípios da PROBIDADE E DA BOA-FÉ”. Assim, resta evidente que nosso Código Civil, que não tem 20 anos ainda, já definiu um padrão que se afasta do ultrapassado princípio que define friamente que o que está escrito tem de ser cumprido.
Diante dessa tragédia mundial que parou o mundo, literalmente, não tenho dúvidas que praticamente todas as relações serão objeto de algum ajuste, resultado da aplicação do princípio da revisão dos contratos (teoria da imprevisão e da onerosidade excessiva). Nesses dias de grave crise e isolamento que estamos vivendo, são vários profissionais de diferentes áreas que afirmam que não sairemos iguais disso. Eu quero acreditar que sairemos pessoas melhores, que sejamos capazes de enxergar de forma mais justa a realidade das partes. Ora, é extremamente fácil demonstrar que a COVID 19 é fato superveniente e absolutamente imprevisível aquelas circunstâncias que existiam e eram conhecidas quando da celebração da avença. A transformação a partir da COVID 19 foram rápidas e radicais.
Assim, concluindo, a renegociação de grande número de contratos em face da Covid-19 se impõe em função das diversas razões acima expostas, de forma a adequar o instrumento à nova realidade. Essa renegociação poderá ser de maior ou menor grau, dependendo da relação que une as partes e pode envolver, por exemplo, a adequação do objeto, um maior prazo ou tolerância para o pagamento, eventual revisão de multas e juros, etc. Há como demonstrar, sem maiores dificuldades, que em função da COVID 19 e o confinamento, que houve a mudança das bases que envolveram inicialmente as partes e a necessidade do reequilíbrio obrigacional, que é o que se busca nesse tipo de relação, sempre com base na PROBIDADE E BOA-FÉ.
Escritório HV Advogados
Guilherme Araújo Hofmeister